STF REITERA ENTENDIMENTO SOBRE INADMISSIBILIDADE DA PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL
DECISÃO (Fonte: www.stf.jus.br)
MED. CAUT. EM HABEAS CORPUS 98.893-8 SÃO PAULO
RELATOR : MIN. CELSO DE MELLO
E M E N T A:
"HABEAS CORPUS". PRISÃO CIVIL. DEPOSITÁRIO JUDICIAL. A QUESTÃO DA INFIDELIDADE DEPOSITÁRIA. TRATADOS INTERNACIONAIS DE DIREITOS HUMANOS. A JURISPRUDÊNCIA CONSTITUCIONAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. ILEGITIMIDADE JURÍDICA DA DECRETAÇÃO DA PRISÃO CIVIL DO DEPOSITÁRIO INFIEL. MEDIDA CAUTELAR DEFERIDA.
- Não mais subsiste, no modelo normativo brasileiro, a prisão civil por infidelidade depositária, independentemente da modalidade de depósito, trate-se de depósito voluntário (convencional) ou cuide-se de depósito necessário, como o é o depósito judicial. Incabível, desse modo, no sistema constitucional vigente no Brasil, a decretação de prisão civil do depositário infiel.
NOTAS DA REDAÇÃO
Na decisão, o Ministro rel. Celso de Mello assim se manifestou:
Com efeito, o Plenário desta Suprema Corte, no julgamento conjunto do RE 349.703/RS, Rel. p/ o acórdão Min. GILMAR MENDES, do RE 466.343/SP, Rel. Min. CEZAR PELUSO, do HC 87.585/TO, Rel. Min. MARÇO AURÉLIO e do HC 92.566/SP, Rel. Min. MARÇO AURÉLIO, firmou o entendimento de que não mais subsiste, em nosso sistema constitucional, a possibilidade jurídica de decretação da prisão civil do depositário infiel, inclusive a do depositário judicial.
Nos julgamentos mencionados, o Supremo Tribunal Federal, ao assim decidir, teve presente o que dispõem, na matéria, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos/Pacto de São José da Costa Rica (Artigo 7º, § 7º) e o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos (Artigo 11).
Em conseqüência de tais decisões plenárias, esta Suprema Corte, no julgamento do 619/STF, que autorizava a decretação da prisão civil do depositário judicial no próprio processo em que se constituiu o encargo, independentemente do prévio ajuizamento da ação de depósito.
Ve-se, daí, que a decretação da prisão civil do depositário infiel, inclusive a do depositário judicial, constitui ato arbitrário, sem qualquer suporte em nosso ordenamento positivo, porque absolutamente incompatível com o sistema de direitos e garantias consagrado na Constituição da República e nos tratados internacionais de direitos humanos (HC 89.634/SP, Rel. Min. MARÇO AURÉLIO - HC 94.523/SP, Rel. Min. CARLOS BRITTO - HC 94.695/RS, Rel. Min. CELSO DE MELLO - HC 96.234/MS, Rel. Min. MENEZES DIREITO). (...)
Em suma: a análise dos fundamentos em que se apóia a presente impetração leva-me a concluir que a decisão judicial de primeira instância, mantida pelo E. Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo e pelo E. Superior Tribunal de Justiça, não pode prevalecer, eis que frontalmente contrária à Convenção Americana sobre Direitos Humanos, ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos e à Constituição da República, considerada, no ponto, a jurisprudência que o Supremo Tribunal Federal firmou na matéria em causa, no sentido de que não mais subsiste, em nosso ordenamento positivo, a prisão civil do depositário infiel, inclusive a do depositário judicial.
Evidente, desse modo, a situação de injusto constrangimento imposta ao ora paciente.
Sendo assim, e em face das razões expostas, defiro o pedido de medida liminar, em ordem a suspender, cautelarmente, a eficácia da decisão que decretou a prisão civil do ora paciente, determinando, em conseqüência, o imediato recolhimento do mandado de prisão civil expedido, contra mencionado paciente, nos autos do HC 98.893-MC / SP.
Em Comentários à Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de San José da Costa Rica), Luiz Flávio Gomes, assim se manifesta: "considerando-se que a Convenção Americana só prevê a prisão civil por alimentos (art. 7º, 7), é certo que nossa legislação ordinária relacionada com o depositário infiel conflita com o teor normativo desse texto humanitário internacional. O conflito de uma norma ordinária (que está em posição inferior) com a Convenção Americana resolve-se pela invalidade da primeira".
O autor ainda menciona como fundamento para que se afaste a regra constitucional que prevê a prisão civil do depositário infiel, o princípio da proporcionalidade.
Vale dizer que, ante as reiteradas decisões neste sentido, hoje é possível afirmar-se que foram eliminadas todas as hipóteses de prisão civil em razão de depósito. Embora vigentes, todas as normas que tratam da matéria são inválidas.
Referência :
Gomes, Luiz Flávio. Comentários à Convenção Americana sobre Direitos Humanos: Pacto San José da Costa Rica / Luiz Flávio Gomes, Valério de Oliveira Mazzuoli. - 2. ed. Ver., atual e ampl. - São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009.
Autor: Áurea Maria Ferraz de Sousa
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